Namorada de fim de semana


Fazia pouco mais de um ano que eu estava sozinha, depois de ter terminado um relacionamento absolutamente tóxico. De repente, meu celular acende com uma solicitação de amizade. Fui ver quem era, mas não reconheci a pessoa. Vi apenas que tínhamos uma pessoa em comum, com a qual também não tinha qualquer intimidade. Como a carinha me agradou, acabei aceitando o convite por educação.
Dias após, eu já nem lembrava que a havia incluído em minha rede social, recebi uma mensagem privada. “Desculpa pela brincadeira com a Amália no outro dia”, iniciava a conversa. Achei super estranha a colocação e de pronto respondi: “não estou entendendo do que você está falando. Não tenho nada com Amália. Na verdade, só a vi uma única vez”.
A partir daí a conversa rendeu bem por horas a fio. Ela foi revelando o fim de um relacionamento longo e tão traumático como o meu. Parecia o encontro de duas almas ávidas por um pouco de amor e paz. Trocamos telefone e não demorou para as chamadas se tornarem mais constantes e intensas. Marcamos de tomar um açaí num local perto da minha casa.
Pessoalmente ela era muito mais bonita. Vivos olhos esverdeados ornamentavam um rosto delicado com uma boca bem delineada, que praticamente implorava por meus beijos. Admito que era complicado não fixar os olhos ora naquela boca linda, ora no enorme decote que – premeditadamente – ela usava. Naquele dia ela sabia exatamente o que pretendia. E não era apenas tomar um simples açaí com uma desconhecida com quem batia papo virtualmente.
Era uma mulher muito interessante. E sabia disso. Tinha consciência de que transitava entre a meninice e maturidade com uma maestria muito singular. Ao mesmo tempo em que podia tratar de assuntos complexos, sabia exalar a leveza da juventude. E isso era encantador nela. O tempo todo meus olhos fitavam-na, ainda que eu tentasse desviar o olhar, havia uma força maior, quase um magnetismo que me forçava a admirar aquela figura quase perfeita em minha frente.
Saímos do açaí e fomos passear pela pequena orla próximo. Com passos lentos, nossa intenção era mesmo a de aproveitar ao máximo a companhia. Com jeito faceiro, ela provocava umas suaves trombadas na intenção de tocar em mim. Queria me sentir de alguma maneira. Já próximo de nos despedirmos, sentamos num quiosque que estava vazio. De repente, me assustei quando furtivamente ela tocou a minha mão. Senti o rosto ruborizar, o sangue subir tão rápido que me esquentou a face. Minha única reação foi a de abaixar o olhar e lançar um sorriso amarelo. Embora não pareça, esse tipo de investida consegue me deixar absolutamente tímida.
Caminhamos até a minha casa. Ficamos na portaria do prédio esperando o motoboy que a levaria para casa. Sentadas no sofá do hall, o contato mais íntimo foi inevitável. Meu coração parecia querer saltar a qualquer momento pela minha boca. Senti a minha circulação completar diversos ciclos numa rapidez impressionante. Confesso que tive medo de ela me beijar - apesar de ali eu já estar doida para sentir aquele beijo – e sermos flagradas pelo porteiro curioso. Marcamos um jantar na casa dela no fim daquela semana. A moto chegou e ela se foi.
A semana seguiu numa lentidão só, apesar de nos falarmos o dia todo, todos os dias. Era maravilhoso acordar com o “bom dia” daquela menina-mulher, um misto de anjo e demônio. Ela preenchia meu mundo como há muito não acontecia. Finalmente chegou a tão esperada sexta-feira.
Passei aquele dia tomada de uma ansiedade sem tamanho. Um misto de sensações dominaram o meu íntimo. Ao mesmo tempo em que ela era uma completa estranha, sentia que estava indo ao encontro de alguém que há muito tempo não via. Arrumei minha mochila com muito cuidado para não esquecer o essencial e fiquei paquerando o relógio até a hora de sair.
Resolvi vestir uma saia longa com blusinha de alça, toda em tom de vermelho. Como sempre, o calor aqui é absurdo e já não estava suportando o peso dos velhos jeans surrados.
Realmente parecia que já nos conhecíamos há décadas. Não houve qualquer constrangimento ou vergonha da minha parte. Me senti como se tivesse entrado na minha casa. Foi impressionante.
Naquela noite nem jantamos, tamanha era a vontade de nos sentirmos. Ela entrou para o banho e eu me joguei sobre a cama. Uma das melhores sensações que já tive foi quando ela saiu do banho e me veio acarinhar. “Isso tudo é pra mim? Nem acredito”, disse sorridente. “Advinha”, respondi marotamente.
Virei-me para recebe-la como se deve. Ela soltou a toalha e a puxei para mim, finalmente colando minha boca naqueles lábios macios. Fizemos amor de uma forma única. Nossos corpos, que nunca se tocaram, conheciam exatamente o quê e como o outro gostava e queria. Liberamos fantasias, exercitamos fetiches e nos amamos sem amarras, sem medo e com absoluta entrega. Coisa de amantes de longa data. Só que, ainda estávamos nos conhecendo.
No dia seguinte, tudo se repetiu com muito amor e respeito. Perdemos a noção do tempo. Fui embora com o coração pedindo mais daquele universo de tormenta e calmaria sexual.
No dia seguinte, cumpri a agenda normal de um domingo de sol. Fui à praia e ao churrasco de uma amiga que fazia aniversário naquele dia. Mal cheguei em casa, tomei um banho e liguei pra ela. “Estou indo praí. Posso?”, rezava para ouvir um sim. Peguei a moto e voltei para aquele ninho de loucuras e insanidades mais deliciosas que já provei.
Jantamos, conversamos, nos descobrimos mais. Falamos dos relacionamentos anteriores, das feridas abertas, das sincronicidades que nos atraíam. O encanto era recíproco. Não demorou para firmarmos o relacionamento.
Qual não foi a minha surpresa ao descobrir que aquele quase sinônimo de perfeição havia mentido para mim. Não demorou e a verdade veio à tona. Sou daquele tipo que acredita piamente que “para um bom leitor, vírgula é texto”, como diz o ditado.
Em uma de nossas conversas ao telefone, em tom de brincadeira, ela soltou: “você é a minha namorada de fim de semana”. Confesso que o sangue ferveu na hora e tive dificuldade de disfarçar o misto de insatisfação, raiva e decepção com a fala. “Como assim? Tá querendo dizer que durante a semana você tem outra?”, retruquei meio que mordendo a língua. Ao perceber o ato falho que cometera, ela tentou mudar de assunto.
Outros sinais foram aparecendo, mostrando que minhas apostas estavam erradas e que aquele brilho que outrora havia em encantado não passava de ouro de tolo. Repentinamente, minhas desconfianças após aquela ligação se firmaram. Sem motivo qualquer que valesse uma separação, fui ferida da maneira mais vil que alguém pode ferir um coração. Ela me abandonou sem dizer motivos contundentes, sem nem me permitir entender qual fora meu erro – se é que incorri em algum -. Saiu da minha vida e voltou para a ex, que tanto a decepcionara.
Prematuramente, nosso relacionamento foi ferozmente abortado e o feto de um amor que já era exemplo para todos que a conheciam foi lançado na sarjeta...
Enfim. A vida é feita de escolhas e cada uma traz em si consequências das quais não podemos fugir. Apesar do profundo baque emocional, consegui me recuperar e estou seguindo adiante, enfrentando meus leões e superando obstáculos.
Não tive mais notícias dela e algo me asserta de que ela também não andou buscando notícias minhas. Se vamos nos reencontrar? Só Deus sabe. Mas, por ora, prefiro deixar como está.



Comentários

  1. Vc nunca foi de final de semana... :'-( Vcs se perderam no caminho! Ela ainda deve amar muito vc.

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  2. Intenso ,e poxa fiquei torcendo para um final feliz ,mas creio que o final pode não ter sido tão feliz ,mais o percurso acabou sendo. A vida é assim,idas e vindas,o ato de conhecer o outro,de debruçar para esta sincronicidade nem sempre ocorre como esperamos . Algumas relações são como aquela frase . "Carpe Diem"

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    1. Nem sempre os finais são felizes. Mas, toda história sempre traz aprendizados.

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